Publicado em 10/10/2015

O microfone passa de mão em mão. Um a um, os professores que lotam a plateia do Oi Futuro Ipanema tomam a palavra. São discursos longos e bem articulados, de quem está acostumado a falar por horas diante de uma classe. A maioria desabafa a partir de experiências próprias – as dificuldades em trabalhar sem infraestrutura, lidar sem qualquer preparo prévio com crianças com necessidades especiais e testemunhar o desinteresse do Estado. Outros teorizam sobre o problema da educação no Brasil, apontando como fatores críticos a falta de comunicação, a defasagem de um ensino tradicional que pouco se preocupou em acompanhar as intensas mudanças sociais ocorridas nos últimos séculos e, acima de tudo, a falta de um projeto comum a gestores, professores e alunos. E, claro, há aqueles que fazem observações sobre o filme exibido, comentando as partes mais tocantes, enaltecendo a importância do projeto ou questionando a quase completa ausência da questão das drogas, assim como a falta dos professores, dos pais e do Estado na tela.

A obra em questão é A aula vazia, que reúne onze curtas de sete países diferentes abordando as várias facetas da evasão escolar – um problema sério na América Latina, onde apenas metade dos jovens termina o ensino secundário. Duas das diretoras, a brasileira Flávia Castro e a mexicana Mariana Chenillo compareceram ao debate na noite de ontem (9 de outubro), assim como a produtora executiva, Gádor Manzano, e a coordenadora de educação complementar e juventude do Instituto Ayrton Senna, Simone André.

Manzano abriu a conversa com uma curiosidade: a produção foi financiada em grande parte pela Coreia do Sul, país que vivenciou uma situação muito parecida com a nossa recentemente, mas que conseguiu contorná-la de maneira radical graças a uma campanha que transformou a educação em uma obsessão nacional. Hoje, na verdade, o país sofre com o problema oposto, sendo obrigado a limitar por lei as aulas extras para poupar seus estudantes, que sofrem com fortes sintomas físicos e psicológicos de estresse devido à pressão a que são submetidos.

As diretoras também falaram sobre seus próprios curtas-metragens. Castro revelou que todos os diretores de A aula vazia tiveram carta branca, e que o tema que escolheu, a falta de interesse nas aulas, é algo muito pessoal: o protagonista é baseado em um jovem que conheceu na vida real, matando aula em uma biblioteca. Contou ainda que os outros personagens são alunos da rede pública, e o filme só não se construiu como um documentário porque as escolas estavam fechadas para as férias na época das filmagens.

Chenillo, por sua vez, explicou que seu curta é a retomada de um projeto iniciado muitos anos antes, no qual acompanhou uma criança com deficiência auditiva no ensino fundamental. Em A aula vazia vemos o rapaz, muitos anos depois, lutando para se integrar a um sistema totalmente despreparado para atender às suas necessidades especiais.

Simone André também foi uma presença marcante, lembrando que a educação é responsabilidade de todos, e que enquanto os alunos, os professores e até mesmo o Estado forem vistos como problemas, eles continuarão sendo problemas. A educadora ressaltou ainda que a missão da educação não é apenas transmitir conteúdo, mas formar pessoas. Para ela, grande parte da questão da educação no Brasil pode ser resolvida através de quatro simples “inovações suaves”: trabalhar no relacionamento entre professor e aluno, fazendo com que o estudante sinta que faz parte, de fato, das aulas; investir nos próprios alunos como instrutores, incentivando os trabalhos em equipe; perguntar em vez de responder; e, finalmente, trabalhar com projetos escolhidos e trazidos pelos próprios alunos, que despertem o seu interesse. André citou ainda estatísticas otimistas, que sugerem avanços lentos, mas significativos.

Perto do fim do debate, uma professora na plateia fez um apaixonado pedido a todos os presentes para que não desistissem de sua missão como educadores. Suraia Mockdece El-Kaddoum, mediadora e professora da rede pública de ensino, declarou: “O fato de estarmos aqui mostra que não desistimos”.

Texto: Clara Ferrer

Fotos: ciadafoto




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