Publicado em 10/10/2016

Por Aisha Rahim (Talent Press Rio)

Em Nos últimos dias da cidade há um desconsolo típico de um requiem. Não sabemos quem contamina quem nesse sopro de morte: se a cidade de Cairo, nas vésperas da Primavera Árabe, sufocada pelo regime de Hosni Mubarak ao longo de 30 anos; se a personagem de ficção, que surge cruzada com essas imagens documentais. A realidade filmada pelo realizador egípcio Tamer El Said é aquela de 2009, dois anos antes do movimento revolucionário que tomaria seu país. Não por acaso, na parte ficcional, temos um realizador perdido na montagem do seu filme e também da sua vida: a mãe está no hospital em estado terminal, a namorada prestes a deixar o país, e ele à procura de um apartamento numa cidade que parece em escombros.

Que função cabe ao cinema no intervalo entre esses dois movimentos – aquele que vem das ruas da capital egípcia e aquele que vem do interior de Khalid? O primeiro longa-metragem de El Said, que passou por festivais importantes como Berlim, responde-nos com mais perguntas. Estamos enclausurados no título, que eloquentemente aparece na tela encerrando o filme. Nos últimos dias da cidade projecta-nos assim num outro mundo de questões. Serão estes os últimos dias de Cairo como a conhecemos ou os últimos dias de Khalid nela? Ou estaremos, antes, perante o fim da cidade enquanto Estado e espaço de cidadania? 

Seja por meio do filme em si, seja por meio do filme nele contido, Nos últimos dias da cidade pergunta-nos o que o cinema pode fazer perante as crises. Ou como o realizador pode surgir como obreiro de um espaço de partilha e reconstrução. 




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