Publicado em 12/04/2025


Isabelle Huppert em Mulheres Diabólicas (La Cérémonie, 1995), de Claude Chabrol

Poucas atrizes vivas hoje sustentam um legado tão poderoso quanto Isabelle Huppert. A artista é reverenciada como uma das maiores damas do cinema francês, o que por si só já seria algo significativo, visto que o país marca a origem de grandes talentos femininos da atuação, como Catherine Deneuve, Juliette Binoche, Jeanne Moreau, Fanny Ardant e Isabelle Adjani.

Entretanto, o impacto geracional que a obra da atriz teve para a sétima arte a coloca como um pilar da atuação contemporânea, extrapolando, inclusive, seu contexto nacional, sendo um dos rostos definidores do cinema europeu e uma das atrizes mais respeitadas do cinema global.

Com mais de 150 créditos em filmes na carreira e 54 anos de profissão, a francesa é uma figura cultuada pela cinefilia internacional por sua habilidade de conferir densidade emocional a personagens austeras, por vezes moralmente duvidosas, donas de uma psicologia interna complexa e fascinante. A crítica cinematográfica por vezes a descreve como "atriz-autora", dada a magnitude de sua assinatura cênica.


As Aventura de Uma Francesa na Coreia (A Traveler’s Needs, 2024), de Hong Sang-soo

"Destemida e hipnotizante, às vezes assustadora, às vezes excêntrica, Isabelle Huppert assumiu uma variedade espantosa de papéis ao longo da carreira, movendo-se com facilidade das lágrimas aos gritos, das histórias mais lineares às mais gloriosamente desvairadas", escreveu a crítica de cinema Manohla Dargis para o jornal The New York Times, que a colocou como a segunda maior atriz do século 21 (atrás de Denzel Washington) em lista publicada em 2020.

Atualmente, o circuito comercial de salas do Brasil tem Huppert em cartaz com As Aventuras de Uma Francesa na Coreia (A Traveler’s Needs), filme que marca mais uma parceria da artista com o cineasta coreano Hong Sang-soo, obra que foi premiada no Festival de Berlim e foi um dos destaques do Festival do Rio 2024.

Presença constante no Festival do Rio

O vínculo entre a obra de Huppert e o Festival do Rio foi construído ao longo de muitas décadas. Desde 1999, ano de nascimento do evento, filmes estrelados por Isabelle Huppert já foram exibidos em 15 das 26 edições do evento, marco digno de nota que se traduz em 32 títulos selecionados para diferentes mostras. 

E mesmo antes do Festival do Rio se estabelecer como o maior encontro de cinema da América Latina, Huppert já carrega uma conexão com o DNA do evento. Em 1994, ela esteve na cidade para a sexta edição da Mostra Banco Nacional de Cinema, evento que anos depois, em 1999, se fundiria ao Rio Cine Festival para dar origem ao atual Festival do Rio.

Amateur (1994), de Hal Hartley
Amateur (1994), de Hal Hartley

Na ocasião, a atriz promoveu o filme Amateur, de Hal Hartley, que na época definiu como "o mais europeu dos cineastas norte-americanos", segundo crônica publicada no site da Revista de Cinema. Desde então, a atriz se tornou presença constante na seleção do festival, seja por sua atualidade cinematográfica, seja por retrospectivas que destacam sua fascinante trajetória.

Com uma carreira marcante, Huppert ultrapassou as fronteiras do cinema europeu, transitou por Hollywood e, mais recentemente, encontrou no cinema asiático um terreno fértil para seguir sua jornada criativa. Diante das câmeras, foi dirigida por realizadores consagrados como Michael Haneke, Jean-Luc Godard, Claude Chabrol, Claude Goretta, Maurice Pialat e Bertrand Tavernier.

Seja interpretando uma mulher abusada sexualmente que planeja uma jornada de vingança em Elle, de Paul Verhoeven, vivendo as fantasias sadomasoquistas de uma mulher reprimida em A Professora de Piano ou encenando a Madame Bovary na versão de Chabrol para o clássico romance de Flaubert, as personagens de Huppert raramente passam despercebidas em cena, até mesmo quando ela atua como coadjuvante.

A Professora de Piano (The Piano Teacher, 2001), de Michael Haneke
A Professora de Piano (The Piano Teacher, 2001), de Michael Haneke

"Desde o início, isso foi uma escolha consciente", disse a atriz em entrevista para a jornalista Sarah Crompton do jornal The Guardian. "Mas, ao mesmo tempo, eu não tinha muita escolha, porque nunca fui realmente chamada para ser a mulher que está sentada atrás do homem, a mulher que existe para valorizar o homem. É preciso ser um certo tipo de mulher para isso. E esse nunca foi o meu caso. Então, de certa forma, o único lugar que me restava era o lugar principal. O que estava ótimo."

No contexto do Festival do Rio, a presença de Huppert percorre décadas de sua história no cinema: desde o divisivo blockbuster hollywoodiano em que atuou, O Portal do Paraíso (1980), de Michael Cimino, exibido na mostra especial América Maldita de Michael Cimino no Festival do Rio 2014 até filmes mais leves e recentes de sua filmografia como Sra. Harris Vai a Paris (2022), de Anthony Fabian.

O Portal Do Paraíso (Heaven’s Gate, 1980), de Michael Cimino
O Portal Do Paraíso (Heaven’s Gate, 1980), de Michael Cimino

Mostra especial homenageou a artista

Em 2009, na 11ª edição do Festival do Rio, a atriz foi homenageada com uma mostra retrospectiva especial dedicada à sua carreira. A programação trouxe longas-metragens como 8 Mulheres (2002), de François Ozon, e Um Amor Tão Frágil (1977), que a revelou ao mundo. Também foram exibidos filmes como Mulheres Diabólicas (1995), clássico de Claude Chabrol, realizador com quem Huppert manteve uma longa colaboração criativa.

No texto sobre a seleção de filmes publicado no cátalogo do Festival do Rio 2009, o curador Fabiano Canosa afirma que a mostra, realizada há mais de 15 anos, já confirmava a "grandeza de Huppert como a maior das atrizes francesas das últimas décadas" e que aquele conjunto de filmes era "a ponta de um iceberg de fogo" que é a filmografia da prolífica atriz. Outros três filmes estrelados por Huppert também estiveram em mostras como Panorama Mundial e Expectativa, totalizando uma oferta de 10 opções de títulos com a atriz naquela edição.

A mostra Retro Isabelle Huppert foi realizada quando o Festival do Rio se juntou às comemorações do Ano da França no Brasil, iniciativa do governo dos dois países para aprofundar a relações bilaterais nos âmbitos culturais, acadêmicos e econômicos. Naquela ocasião, o tapete vermelho do festival foi abrilhantado pelas presenças de Jeanne Moreau e Agnès Varda.

8 Mulheres (8 femmes, 2002), de François Ozon
8 Mulheres (8 femmes, 2002), de François Ozon

Nos anos seguintes, os filmes com a atriz seguiram presentes, com destaque para as exibições do romance Dois Lados do Amor (2014), de Ned Benson, produção norte-americana com James McAvoy, Jessica Chastain e Viola Davis no elenco; do drama Uma Relação Delicada, de Catherine Breillat, em que interpreta uma cineasta parcialmente paralisada após um AVC; e da produção coreana A Câmera de Claire (2017), a segunda das três colaborações entre Huppert e Hong Sang-soo.

Dois Lados do Amor (The Disappearance of Eleanor Rigby: Them, 2014), de Ned Benson
Dois Lados do Amor (The Disappearance of Eleanor Rigby: Them, 2014), de Ned Benson

Desde 1999, o Festival do Rio transforma a Cidade Maravilhosa em um ponto de encontro com o melhor do cinema global e parte dessa magia se deve à presença constante da obra de artistas como Isabelle Huppert. 

Com sua elegância e magnetismo em cena, a atriz francesa construiu uma carreira marcada por coragem, complexidade e entrega, explorando as zonas de desconforto da experiência humana e também seus momentos mais sensíveis e delicados. Enquanto ela continuar a se lançar com generosidade em papéis tão singulares, o público carioca seguirá atento e curioso para receber as novas revelações desta força inimitável da atuação mundial.

A seguir, relembre todos os filmes de Isabelle Huppert que já foram exibidos no Festival do Rio

Festival do Rio 2024 - 26th Rio de Janeiro Int’l Film Festival

As Aventura de Uma Francesa na Coreia (A Traveler’s Needs, 2024), de Hong Sang-soo | Exibido na mostra Panorama Mundial

Festival do Rio 2022 - 24th Rio De Janeiro Int’l Film Festival

Sra. Harris Vai a Paris (Mrs. Harris Goes to Paris, 2022), de Anthony Fabian | Exibido na mostra Panorama Mundial

EO (IO, 2022), de Jerzy Skolimowski | Exibido na mostra Panorama Mundial

Belas Promessas (Les Promesses, 2021), de Thomas Kruithof | Exibido na mostra Expectativa

Festival do Rio 2019 - 21th Rio De Janeiro Int’l Film Festival

Frankie (2019), de Ira Sachs | Exibido na mostra Panorama Mundial

Festival do Rio 2017 - 19th Rio De Janeiro Int’l Film Festival

A Câmera de Claire (La Caméra de Claire, 2017), de Hong Sang-soo | Exibido na mostra Panorama Mundial

Barreiras (Barrage, 2017), de Laura Schroeder | Exibido na mostra Expectativa

Festival do Rio 2016 - 18th Rio De Janeiro Int’l Film Festival

Souvenir (2016), de Bavo Defurne | Exibido na mostra Expectativa

Festival do Rio 2014 - 16th Rio De Janeiro Int’l Film Festival

Dois Lados do Amor (The Disappearance of Eleanor Rigby: Them, 2014), de Ned Benson | Exibido na mostra Panorama Mundial

Dior and I (Dior et moi, 2014), de Frédéric Tcheng | Documentário | Exibido na mostra Itinerários Únicos

O Portal Do Paraíso (Heaven’s Gate, 1980), de Michael Cimino | Exibido na mostra A América Maldita de Michael Cimino

Festival do Rio 2013 - 15th Rio De Janeiro Int’l Film Festival

Uma Relação Delicada (Abus de faiblesse, 2013) Catherine Breillat | Exibido na mostra Panorama Mundial

Tip Top (2013), de Serge Bozon | Exibido na mostra Panorama Mundial

Michael Haneke - Profissão: Diretor (Michael H. – Profession: Director, 2013), de Yves Montmayeur | Exibido na mostra Filme Doc

Festival do Rio 2011 - 13th Rio de Janeiro Int’l Film Festival

Mondo Lux: The Visual Worlds of Werner Schroeter (Mondo Lux - Die Bilderwelten des Werner Schroeter, 2011), de Elfi Mikesch | Exibido na mostra Filme Doc

Festival do Rio 2010 - 12th Rio De Janeiro Int’l Film Festival

Copacabana (2010), de Marc Fitoussi | Exibido na mostra Expectativa

Festival do Rio 2009 - 11th Rio De Janeiro Int’l Film Festival

8 Mulheres (8 femmes, 2002), de François Ozon | Exibido na mostra Retro Isabelle Huppert

Minha Terra, África (White Material, 2009), de Claire Denis | Exibido na mostra Panorama Mundial

Uma Barragem contra o Pacífico (Un barrage contre le Pacifique, 2008), de Rithy Panh | Exibido na mostra Panorama Mundial

O Amor Escondido (L'amore nascosto, 2007), de Alessandro Capone | Exibido na mostra Expectativa

A Comédia do Poder (L'Ivresse du pouvoir, 2006), de Claude Chabrol (também exibido no Festival do Rio 2006) | Exibido na mostra Retro Isabelle Huppert

Mulheres Diabólicas (La Cérémonie, 1995), de Claude Chabrol | Exibido na mostra Retro Isabelle Huppert

A Separação (La Séparation, 1994), de Christian Vincent | Exibido na mostra Retro Isabelle Huppert

Coup de Torchon (1981) de Bertrand Tavernier | Exibido na mostra Retro Isabelle Huppert

Coup de foudre (1983), de Diane Kurys | Exibido na mostra Retro Isabelle Huppert

Um Amor Tão Frágil (La Dentellière, 1977), de Claude Goretta | Exibido na mostra Retro Isabelle Huppert

Festival do Rio 2008 - 10th Rio de Janeiro Int’l Film Festival

Home (2008), de Ursula Meier | Exibido na mostra Expectativa

Festival do Rio 2007 - 9th Rio de Janeiro Int’l Film Festival

Propriedade Privada (Nue propriété, 2006), de Joachim Lafosse | Exibido na mostra Expectativa

Festival do Rio 2006 - 8th Rio De Janeiro Int’l Film Festival

A Comédia do Poder (L'Ivresse du pouvoir, 2006), de Claude Chabrol (também exibido no Festival do Rio 2009) | Exibido na mostra Panorama Mundial

Gabrielle (2005), de Patrice Chéreau | Exibido na mostra Panorama Mundial

Festival do Rio 2003 - 5th Rio de Janeiro Int’l Film Festival

The Promised Life (La Vie promise, 2002), de Olivier Dahan | Exibido na mostra Panorama Mundial

Festival do Rio 2000 - 2nd Rio de Janeiro Int’l Film Festival

Crônica da Inocência (Comédie de l'innocence, 2000), de Raúl Ruiz | Exibido na mostra Panorama Mundial

The King’s Daughters (Saint-Cyr, 2000), de Patricia Mazuy | Exibido na mostra Panorama Mundial


Siga o Festival do Rio nas redes sociais:


O Festival do Rio conta com patrocínio master da Shell, através da Lei Federal de Incentivo à Cultura, e com apoio especial da Prefeitura do Rio de Janeiro por meio da RioFilme, órgão da Secretaria Municipal de Cultura do Rio.



    Voltar

    Edição 2024