Publicado em 11/10/2016

O Cine Encontro recebeu ontem (segunda-feira, 10) o diretor Emílio Domingos para conversar sobre seu filme Deixa na régua, documentário que acompanha três barbearias de regiões periféricas do Rio de Janeiro especializadas em desenhos complexos a máquina que fazem sucesso entre os jovens, transformando esses ambientes em verdadeiros pontos de socialização. A conversa, mediada pelo jornalista Fred Coelho, contou com os três principais personagens do filme, os barbeiros Belo, Ed e Deivão.

Coelho iniciou o debate questionando como se criou a relação de intimidade entre Domingos e os clientes das barbearias, visto que as cenas captadas por sua câmera mostram uma grande desconstração. Deivão, que trabalha em Magé, região metropolitana do Rio, contou que a primeira semana foi difícil, pois todos olhavam para a câmera, apesar da insistência por parte do documentarista de que, ali, ele deveria permanecer invisível. Acrescentou que, com o tempo, foram se acostumando e a conversa passou a fluir mais naturalmente.

Ed, que opera em Piedade, afirmou que as discussões que aparecem no filme, em sua grande maioria sobre mulheres e festas, são muito frequentes nesses espaços, e que as “baixarias” são ditas mesmo na presença de crianças. Segundo Belo, da Vila da Penha, o clima de descontração e intimidade é essencial para contornar o tédio do trabalho, sendo um dos principais motivos pelos quais afirma que jamais trabalharia numa barbearia de shopping. O diretor acrescentou que todos os membros da equipe ganharam apelidos como Cabeludo, Barbudo e Osama Bin Laden, pelo contraste com os jovens de cabelo raspado semanalmente.

Domingos relatou que o primeiro contato com o universo dos barbeiros de periferia - ou “artistas capilares”, como Ed gosta de se chamar - se deu durante as gravações do seu longa anterior, A batalha do passinho, pois vários dos dançarinos retratados no documentário se encontravam nesses pontos. Contou ainda que seu interesse inicial pelo assunto era de natureza estética, desejando retratar a originalidade e complexidade dos cortes, mas as conversas entre os jovens que lá se reuniam trouxeram outra camada ao filme, levando-o até a descartar a hipótese de acompanhar esses personagens em outros ambientes.

Abrindo-se o debate para perguntas da plateia, a conversa enveredou para o cenário da distribuição e exibição de documentários como os de Domingos. O realizador contou que, num universo de dominação dos shopping centers por blockbusters, é necessário buscar outros caminhos de circulação, e que os cineclubes têm papel importante nesse circuito alternativo. Questionado sobre as dificuldades de se fazer um cinema periférico, em múltiplos sentidos da palavra, Domingos reforçou que a tecnologia digital foi essencial para se democratizar a realização, e encerrou a conversa com um encorajamento a alguns aspirantes a cineastas presentes na plateia: “Tenham boas ideias, mobilizem-se e façam filmes”.

Texto: Vinícius Spanghero

Fotos: Dave Avigdor




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