Publicado em 11/10/2023

Foto: Ian Melo

Após quase 40 anos de contribuições para a formação artística e cidadã de crianças e adolescentes no morro do Vidigal, o grupo Nós do Morro concretizou um sonho antigo de realizar seu primeiro longa-metragem ficcional com A Festa de Léo. Na seleção oficial do Festival do Rio neste ano, o filme compete na Première Brasil e foi exibido em uma sessão com debate com o público nesta terça-feira (10/10) no Cine Odeon - CCLSR.

“Filme é um tributo ao Nós do Morro, ao cinema nacional e ao público que quer se ver no cinema. A gente quer ver a nossa favela, o nosso subúrbio”, comentou o produtor Diogo Dahl no debate. O elenco do filme é formado majoritariamente por atores que tiveram suas trajetórias ligadas à ONG, incluindo participações especiais de Babu Santana, Roberta Rodrigues, Thiago Martins e Jonathan Azevedo.

A protagonista é Cíntia Rosa, que vive Rita, mãe que prepara com empenho uma grande celebração para o aniversário de 12 anos de seu filho, Léo, interpretado por Arthur Ferreira, fenômeno das redes sociais conhecido como Nego Ney. Na manhã do dia da festa, Cíntia descobre que o dinheiro que tinha reservado para os festejos foram roubados por Dudu (Jonathan Haagensen), pai de Léo, que faz o que pode para manter uma boa relação com o filho, mas é dependente químico e adquiriu uma dívida com traficantes que coloca sua vida em risco. Ao longo de um dia, a mulher tentará encontrar soluções para arrecadar o dinheiro que pode salvar Dudu e o aniversário do menino, contando com a ajuda de amigas e de familiares.


“Essa personagem é incrível, é uma mulher brasileira com todas as letras”, celebrou Cíntia. “Ela está na base da pirâmide e carrega o mundo nas costas. Pude me inspirar em diversas pessoas, inclusive da minha família. As mulheres na favela são uma rede muito amorosa. Uma cria o filho da outra. Enquanto uma está trabalhando, a outra está de olho.” 

Com direção de Luciana Bezerra, cineasta e presidente do grupo Nós do Morro, e de Gustavo Melo, A Festa de Léo foi inicialmente idealizado como um curta-metragem que teria o título de “O Churrasco”. O projeto começou a ser desenvolvido depois que Luciana e Gustavo desistiram de rodar um filme que seria, na avaliação deles, mais ambicioso e complexo de filmar. 

“Queríamos uma história que poderia se passar dentro do Vidigal e fosse mais barata”, comentou a cineasta. Só que alguns desafios se impuseram durante a produção, que se mostrou suficientemente complexa por conta do número de atores e desdobramentos da trama. “É a primeira vez que a gente faz um filme de ficção. Olha, meu povo, recriar a realidade não é fácil”, disse a diretora.

Renato Falcão, diretor de fotografia, é gaúcho e uma das poucas pessoas da equipe que é de fora do Rio de Janeiro. Ele conta a ideia era apresentar uma estética que fosse a “mais natural possível” e que fugisse das convenções dos chamados “favela movies”.

O diretor e pesquisador Bruno Duarte, que mediou o debate, se disse feliz por assistir a um filme com elenco majoritariamente negro que transmita beleza, ao mesmo tempo em que não romantiza a realidade, trazendo uma história cheia de nuances. A forma como o filme tangencia as mazelas sociais do Rio de Janeiro foi tema de algumas perguntas da plateia. Em uma delas, os diretores foram questionados a falar mais sobre um personagem que é uma criança que carrega um fuzil. “O personagem Betinho corta meu coração, mas ele é uma realidade. Ter meninos soldados do tráfico é muito triste porque eles não estão sonhando. E um adolescente que não sonha não vai viver muito tempo”, comentou Bezerra.

Texto: João Vitor Figueira



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Edição 2023