Publicado em 08/10/2023

Para Heloisa Teixeira, escritora e imortal da Academia Brasileira de Letras que recentemente aposentou o famoso sobrenome Buarque de Hollanda, a sessão do documentário Helô no Festival do Rio representa o fim de um sentimento que ela definiu, de forma bem humorada, como uma “certa agonia”. “Eu queria muito saber o que o meu filho pensa sobre mim. É algo que eu jamais teria acesso”, comentou a escritora em um debate com o público realizado na manhã deste domingo (8/10) no Cine Odeon - CCLSR.

O longa-metragem é dirigido pelo filho mais velho da escritora, o cineasta Lula Buarque de Hollanda, e integra a mostra competitiva de documentários da Première Brasil. 

O realizador, que já fez documentários sobre Gilberto Gil e sobre a Velha Guarda da Portela, contou que gosta de contar a histórias de “coisas eternas” em seus filmes e que o processo de produção de Helô o fez conhecer muitos detalhes sobre a trajetória de vida de sua mãe, incluindo o contato dela com a contracultura norte-americana no período em que Teixeira viveu nos Estados Unidos na década de 1960 e chegou a frequentar um show de Janis Joplim, antes da cantora despontar como ícone hippie.

Inicialmente receoso de que uma produção sobre a vida de uma intelectual pudesse ser, em suas palavras, “muito careta”, Lula contou que buscou uma maneira de fazer um filme capaz de entreter e envolve o público ao decidir mostrar mais da relação afetuosa de Teixeira com filhos e netos. “Uma coisa que salta no filme é a coisa do afeto e o balanço do lado mais intelectual com o lado do ser humano”, comentou.

Além de abordar o papel de Heloisa como uma das figuras importantes do pensamento cultural brasileiro de sua geração e mostrar a intimidade da biografada com a família, o longa-metragem também apresenta, como numa metalinguagem, a escritora participando de reuniões de roteiro do próprio filme do qual é tema e comentando questões urgentes, do feminismo à necessidade que pessoas brancas se engajem na luta antirracista. A mudança recente do nome da intelectual também é foco da conversa. Há alguns meses a pensadora adotou o sobrenome Teixeira como forma de homenagear sua mãe, deixando de lado a alcunha que herdou de seu primeiro marido, Luiz Buarque de Hollanda.

O tema da mortalidade da “imortal” também entra em pauta no longa. No debate, Heloisa, atualmente com 84 anos, disse que a sociedade não prepara as pessoas para viver a velhice. “A gente chega sem instrumentos para encarar esse momento”, comentou, revelando que seguir trabalhando “o triplo” a ajuda a se sentir motivada. 

Lula Buarque de Hollanda foi um dos fundadores da Conspiração Filmes, mas deixou a companhia para se tornar sócio da produtora independente Espiral. Ele conta que tem se interessado mais por filmes na fronteira entre a vídeo arte e o documentário nos últimos anos e cita O Muro (2017), dirigido por ele, como um trabalho com uma veia mais experimental que ele gosta de fazer. Helô, entretanto, vai à contramão dessa proposta. “O filme sobre a minha mãe é totalmente despretensioso, feito no afeto. A gente só teve grande estrutura de produção nas filmagens na Academia Brasileira de Letras. Mas este é um filme em que o recorte não é o enquadramento ou saber se a luz está batendo. A gente queria realmente pegar a alma da minha mamãezinha e acho que a gente chegou perto [risos].”

Texto: João Vitor Figueira



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